quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Walter Belinzoni






Walter Belinzoni

Por Clóvis Fantin


Foi no inicio dos anos 40 que o ainda jovem Walter fez suas primeiras viagens a Araranguá. Por aqui, seu pai Carlos Belinzoni resolvera expandir os negócios da família. Na época, a demanda da farinha de mandioca era a grande vilã da exportação. O ano era 1943. Walter contrai núpcias com Maria Barbosa e somente em 1946 o gaúcho porto-alegrense fixa residência em definitivo na Cidade das Avenidas.

De visão privilegiada, o jovem empresário iniciava aqui seu sucesso pessoal e profissional nos ramos do trigo e do arroz.

Com o passar do tempo e incentivado por amigos, em outubro de 1950, candidata-se pela primeira vez a prefeito municipal pelo seu partido, a extinta UDN.

Em 1951, Walter Belinzoni eleito prefeito de Araranguá, cargo que estendeu-se até 1956 e contou com o apoio do então governador dos catarinenses, Irineu Bornhausen.

Como administrador dos araranguaenses, ele concluiu o Hospital Bom Pastor e o Ginásio Nossa Senhora Mãe dos Homens, duas obras consideradas de grande vulto na região sul do estado. Para cá vieram, a convite do prefeito Walter Belinzoni, professores padres da cidade gaúcha de Caxias do Sul com o objetivo de somar qualidade de ensino à grande legião de estudantes araranguaenses.

A complementação das obras do então “campo de aviação” daqui permitiu os vôos regulares dos inesquecíveis DC-3. Um período lembrado com saudade por aqueles que testemunharam o grande feito.

Seu principal objetivo como chefe do executivo consistia nas áreas de educação e cultura, apesar da precária arrecadação. Juntamente com seus grandes amigos Afonso Ghizzo, André Wendhausen e Artur Campos, considerados os desbravadores do Balneário Morro dos Conventos, deixou o conhecido Hotel, e o prédio do condomínio Erechim, as marcas maiores do progresso. Extremamente caseiro Walter dedicava-se por inteiro às entidades filantrópicas. Quando prefeito mandou instalar água potável inteiramente grátis às famílias carentes.

Antes de seu desaparecimento, em 6 de agosto de 1991, Walter Belinzoni declarou: “Araranguá tem um grande futuro. O araranguaense é gente boa. É um povo ordeiro e um povo trabalhador”.


JORNALECO. Pág. 3 - Araranguá - 1 de Abril de 2003 - Ano 9 - Nº 177



sexta-feira, 3 de julho de 2009

Sálvio Amaro Pereira



Sálvio Amaro Pereira

Nasci em 1918, em Araranguá, cidade onde cresci, trabalhei e me aposentei. Sou pela justa razão, genro do Coronel João Fernandes, já casei com a neta criada por ele, Amélia Fernandes Luchina. Ela era filha de Ernesto Antonio Luchina e Francisca Luchina. A Francisca era filha legitima do Coronel João Fernandes e mãe de minha primeira esposa, já falecida. O coronel era um homem calmo, mas muito rígido. Foi chefe político respeitado e muito procurado pelos moradores do grande município que era Araranguá, nas épocas de seus mandatos.
Eu entrei para a prefeitura no mandato do então Prefeito Caetano Lummertz. Trabalhei nesta região inteira como Intendente. As viagens eram feitas a cavalo, o que pelo fato da enorme região, era uma missão difícil.
Conheci a maioria dos prefeitos de Araranguá. Só não tive contato com os que assumiram antes de eu nascer. Mas como o Coronel João Fernandes ficou muito tempo no poder, inclusive antes de eu nascer e depois, então pude conhecer os outros que vieram depois. Quando entrei na prefeitura fui prestigiado pelo futebol que apresentava. Diziam que eu era muito ligeiro. Fui titular 18 anos em Araranguá, inclusive no famoso Grêmio Esportivo Araranguaense, time campeão estadual. Eu sou um homem modesto, mas olha, era difícil encontrar um goleiro como eu, que jogasse bem e gostasse tanto da posição. Muitos vieram, para fazer passe para outro clube, mas o prefeito não permitia e naquele tempo não se dava muita atenção para isto, porque financeiramente também não valia a pena. Hoje é que o Futebol se profissionalizou muito. Ainda trabalhando na prefeitura, me envolvi muito com as bandas musicais. Sou alias conhecido como músico. Muitos ao se referirem à banda, costumam dizer: “Banda do Sálvio Amaro”. Isto porque desde os meus 15 anos venho tocando em bandas. Hoje, com muito prazer, ainda participo desta nova que esta ai, junto com os músicos mais novos, o que faz com que a gente também se renove. No inicio tocava clarineta, depois experimentei o sax alto e outros instrumentos, mas as clarinetas, na verdade foi instrumento que mais me dediquei.
Atualmente estou aposentado. Até, curiosamente, entrei na prefeitura quando nasceu o Sr. Osmar Nunes. Este, posteriormente foi prefeito e foi ele quem me aposentou, em seu mandato.
Há muitos anos moro na Lagoa da Serra, onde cultivo amendoim, melancia, milho, criação de alguns animais e pesca de cará. Gosto muito daqui. Araranguá é uma cidade maravilhosa, onde tenho muitos amigos. Sempre que resolvo andar pelo centro não dou conta de conversar com tantas pessoas. Faço questão das amizades, isto é uma coisa muito importante.

DALL’ALBA, João Leonir. Histórias do Grande Araranguá. Gráfica Orion. (pág - 473,474).

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Expedicionario Iracy Luchina




Iracy, momentos antes da partida.
Por Alexandre Rocha

O Rio Araranguá estava calmo naquela manhã e o leve choque das águas com a balsa soava como um acalento para os ouvidos do moço que se preparava para deixar a cidade. Passado o Araranguá, com um cordial aceno ao balseiro, seus passos seguiram pela pequena, mas movimentada Barranca do inicio dos anos quarenta, com sua estrutura quase toda voltada para os serviços da estação Ferroviária Dona Thereza Cristina. Iracy tomou rumo em direção à oeste, com o propósito de fazer uma visita especial de despedida. Antes, porem, deu uma paradinha na estação, conversou com algumas pessoas, confirmou alguns horários de partida e ficou ali um pouco a observar a rotina de passageiros. Eram pessoas da cidade, viajantes, carregadores e comerciantes que aguardavam suas encomendas. Momento depois continuou sua caminhada, já deixando a Barranca e margeando a estrada de ferro, a imaginar a cada passo, que logo mais, naquele dia, tomaria o trem como aquelas pessoas à espera da locomotiva. Já bem adiante, deixava vagar sua mente em sucessivas imaginações, entre sonhos e esperança, enquanto seus olhos se perdiam na seqüência das incontáveis dormentes de sustentação da ferrovia.
Como será chegar ao Rio de Janeiro? Esta a provável constante indagação de sua jovem ansiedade. Deixar a terra natal, os amigos, a família, a menina-moça por quem se apaixonara...
Avistando ao longe, encontrou na paisagem a casa de Maria, seu destino, o primeiro amor, dele e dela. O namoro às escondidas, pela contrariedade dos pais da moça, tinha o tempero da trama da paixão. Seus encontros aconteciam nas domingueiras do Tio Dico, irmão de Iracy, bastante procuradas pelos jovens da época. Maria, apesar dos 13 para 14 anos, levava uma vida de muito trabalho, ajudando os pais nos afazeres da casa e da roça, onde plantavam milho, mandioca, feijão, alem de criarem porcos para a engorda e cortarem madeira para a rede ferroviária. Sua casa ficava no sitio onde hoje imensos e verdejantes arrozais enfeitam a paisagem que margeia a BR 101, pouco antes da localidade de Sanga do Marco.
Mesmo não fazendo gosto pelo namoro da filha, os pais de Maria receberam bem Iracy, que, ensejando despedir-se da família, e principalmente de Maria, não poderia deixar de ficar mais um pouco e até quem sabe aceitar o convite para o almoço, que por sinal estava sendo preparado por ela. Ao avistar a chegada do pretendente, a mocinha suspendeu por hora a sua fatigante rotina, ficando mais ali por casa e assim podendo dedicar a ele momentos de boa conversa nos derradeiros instantes que precediam a sua viagem “galinha velha ensopada ao molho de batatinhas”. Iracy não resistiu e se fartou de comida predileta colocada a mesa da varanda. Enquanto tilintavam os talheres nos pratos em meio ao desconfortante silencio dos pais da moça, surgiam tímidos e vagos comentários sobre a brava viagem que faria atendendo a convocação do Exercito.
Sua convocação ocorreu num chamado onde os alistados foram reunidos no Jardim Alcebíades Seara. Muitos deles já haviam servido no tiro de guerra de araranguá. A corporação existia nas cidades, formada por voluntários que faziam patrulhamento pelas ruas. O QG do agrupamento era situado nas proximidades do morro centenário, onde também eram depositados armamentos, munições e outros apetrechos. Entre os que serviam a milícia, estavam, alem de iracy luchina, alguns de seus muitos amigos, como Jose Bernardino coelho, chamado de cabo magro, augusto destro, armelino cesa, João bolacha, Tapuri Leite, entre outros. Dos que se apresentaram na praça, a maioria foi dispensadas e alguns como Destro, João bolacha e iracy, seguiram para o Rio de Janeiro.
As atrocidades do nazismo já atormentavam o mundo em plena vigência de um dos momentos mais pobres da humanidade, a segunda guerra mundial, mas até a ida para o rio, Getulio Vargas ainda não havia se deixado seduzir pela participação brasileira na guerra.
Seguiu então para o Rio de Janeiro e no decorrer dos meses seus contatos com sua cidade natal foram ficando escassos, sendo poucas as cartas enviadas por ele, tanto para a família quanto para Maria. Sabe-se que nas raras correspondências o assunto principal era a saudade e o sonho de voltar para Araranguá, embora isto somente fosse possível após receber a baixa definitiva do Exercito, até porque os subsídios que recebia não permitiam o privilegio de tão longa viagem. Na verdade seu destino era outro e a viagem seria para um caminho contrario e bem mais distante. A inclusão do nome Iracy Luchina na lista dos integrantes da FEB que iriam para a batalha da Itália não seria nenhuma grande surpresa, uma vez que aumentavam as expectativas em torno do envolvimento do Brasil na Guerra. Embora Getulio Vargas já tivesse manifestado rompimento com o Eixo, firmado posição em favor dos aliados, e declarada guerra contra a Alemanha e a Itália, após ataques a frotas mercantes brasileiras, o envio do primeiro contingente de soldados da FEB somente ocorreu em julho de 1944 e não se sabe ao certo se Luchina embarcou junto aquele grupo.
Os sonhos de retorno, a namorada, sua terra, a família, os amigos, todos os pensamentos acompanharam o pracinha Iracy a cada anoitecer no horizonte infindável da travessia do atlântico em direção ao cenário obscuro da Segunda Guerra Mundial. Tão distante, seu dia a dia, agora, era o ambiente incerto do confronto, a caserna o seu aconchego, e os companheiros de cada momento, eram os integrantes do 11º Regimento de Infantaria.
Iracy Luchina estava lá... Lá estava ele, sem que precisasse estar, compondo o triste momento que poderia não ter existido e que esta civilização teve que amargar nos tão recentes anos quarenta.
De onde veio Iracy? Quem era ele entre tantos anônimos? Se pudesse e quisesse talvez dissesse aos outros, trechos de versos da Canção do Expedicionário, que parece ter sido feita só para ele:
“(...) Eu venho da minha terra, (...)
Venho de minha Maria, cujo nome principia na palma da minha mão...(...)”.
Mas Maria, a moça que habitou seus sonhos, foi aos poucos sendo tomada pelo pacato cotidiano de sua pequena cidade, sabendo não ao certo, mas ser bem distante o paradeiro do namorado que foi para a guerra. Tão jovem, ela foi aos poucos entendendo ser difícil tão cedo rever Iracy. Sua vida de moça do interior do município, envolvida com os afazeres do trabalho da roça e da casa, lhe reservava ainda os tempos de folga, quando aconteciam os namoricos nos animados passeios e danças dos domingos à tarde, tão aguardadas por ela e pelos jovens da redondeza. De Iracy poucas lembranças iam sobrevivendo até perderem totalmente o contato...
Quando o Cabo Magro (José Bernardino Coelho), amigo de Iracy, como também seu ex-companheiro de Tiro de Guerra, ao vir de Criciúma, onde trabalhava, ouviu a alguns quilômetros o apito do trem anunciando sua chegada na estação Dona Thereza Cristina, na Barranca, colocou a cabeça na janela e lá se foi o seu chapéu “Ramenzoni” pelos ares, indo cair numas plantações de mandioca, sendo recolhido por uma moça das vizinhanças que amontoava lenha a ser recolhida aos vagões. Seu nome: Maria, simplesmente Maria...
O gosto pelo fino chapéu não era à toa. José Bernardino gostava de se vestir bem e, para fazer suas roupas, procurava nas lojas as melhores peças e as entregava para bons alfaiates.
Passaram-se algumas domingueiras e por vezes os olhares se encontravam em alternadas trocas entre farras de amigos numa mesa e cochichos das confidentes moças em outra, até que Cabo Magro, um dia, ajeitou a gola do paletó sobre o pescoço, tirou Maria para uma dança e resolveu oferecer-se para uma dança e resolveu oferecer-se para acompanhá-la até em casa.
Às deliciosas paqueras, somaram-se encontros no Jardim, troca de bilhetinhos e até uma charmosa tarde de futebol para ver o Grêmio Esportivo Araranguaense. Daí para um convite mais audacioso, na mesma estrada que os trazia após a partida, foi um tapa e Maria aceitou ser a noiva do Cabo Magro que jurava de pés juntos já ter desmanchado seu noivado em Criciúma e só para ficar com ela. Em menos de um mês já estavam com alianças compradas e em cinco meses o casamento arrumado... Maria já meio cansada da lavoura arrumou um bom partido, afinal o Cabo Magro era bem conhecido, de boa família, trabalhador, o sonho das donzelas...
Dos cerca de 25 mil soldados brasileiros que foram para a segunda guerra, morreram mais de quatrocentos entre eles o nosso conterrâneo Iracy Luchina, vitimado por uma bala no dia 12 de dezembro de 1944.
Em Julho de 1946 foram conferidas à memória do soldado duas medalhas, posteriormente entregues a sua família, denominadas: Medalha sangue do Brasil e Medalha de Campanha. À cidade de Araranguá foi conferido em janeiro de 1962 o Diploma de cooperador, entregue pela associação dos ex-combatentes do Brasil. Na entrada do Calçadão da avenida Getulio Vargas, (então presidente do período da guerra) esta o monumento ao praça Iracy Luchina, que traz o registro: “Os santos e heróis moram no céu...”.

TEXTO: ALEXANDRE ROCHA


Jornaleco - 25 de novembro de 1998 - Ano 5 - 85
Jornaleco - 10 de janeiro de 1999 - Ano 5 - 87

Anexo Fotos do Arquivo Histórico de Araranguá

Padre Antônio Luiz Dias


Padre Antônio Luiz Dias

Padre Antônio Luiz Dias é sem dúvida, uma das grandes figuras do velho Araranguá a ser colocado num pedestal ao menos igual ao do Coronel João Fernandes de Souza. Padre bom, desprendido, zeloso, interessado não só pelo bem espiritual, mas também físico e social do rebanho espalhado por todo o sertão de Araranguá. Não tinha horas para atender os doentes e levar-lhes os confortos espirituais nos mais remotos rincões da costa da serra.
Mantinha dois animais muito bem tratados, para isto. Quase sempre um sacristão o acompanhava, mas não temia embrenhar-se sozinho pelas picadas das florestas, mesmo à noite, em épocas de intenso banditismo. (No mês de fevereiro de 1924, houve mais de trinta mortes). Nunca cobrou pelas funções sacerdotais. O povo trazia-lhe com carinho o necessário para seu sustento. Eram carradas de lenha, de milho para os cavalos, eram aves e animais. O padre desfazia-se do que não necessitava em favor dos mais carentes. Gostava de dar remédios de ervas, especialmente contra a epidemia mais comum que era a infestação geral de lombrigas. Mandava vir o óleo vermífugo em latas. Reunia a meninada que vinha à igreja e ia dando uma colher do santo óleo a cada um. Um homem bom o padre! Sua casa sempre estava aberta de dia. De noite era só chamar.
Eram celebres pela qualidade seu cavalo e uma mulinha marchadeira. Um dia uns malvados roubaram os animais. Mas o povo andou procurando e acabou achando.
Entre outras atividades, Araranguá deve-lhe a primeira luz elétrica. De inicio tentou com motores a óleo, na Barranca. Não deu bom resultado. Com parêntese outros constituiu uma sociedade. Aí foi até o Meleiro, onde colocou uma hidráulica com turbina e gerador. Não hesitou em pedir emprestadas grandes quantias em dinheiro, conscienciosamente aplicadas e depois devolvido. E eis a usina e extensa rede prontas. Araranguá entra na idade moderna.
Para sentir-lhe o caráter e a maneira de ser, só uma entre as mil anedotas, algumas narradas neste livro, como uma contada pelo Artur Bertoncini: um dia uns integralistas comentaram que o padre era contra o integralismo. Pois eu disse que iria mostrar que não era tanto assim. “Padre Antonio, permita que o andor da procissão seja carregado por nós integralistas, uniformizados de camisa verde?” “Vai ficar bonito!”, comentou. E carregamos o andor.
Padre Antônio já velhinho, foi vitima de ingratidão por parte de alguns araranguaenses. Um abaixo-assinado de umas cem assinaturas foi enviado ao Bispo D. Joaquim, pedindo sua retirada. Ao saber disto, outro abaixo-assinado, agora com mais de mil assinaturas, foi enviado ao Bispo, pedindo para que ficasse. Mas o Bispo foi inflexível. Já ordenara que o padre se transferisse para Camboriú. E para lá foi dizendo: “Que Deus pague aos que me quiseram bem e também aos que não me quiseram”. Diz-se que Deus pagou. As cabeças do primeiro abaixo-assinado, pura coincidência ou não, foram logo morrendo, empobrecendo, adoecendo ou tendo problemas graves na família.
O Padre Antônio ficou gravado na memória de uma geração. A história lhe deve gratidão. Ele morreu no cumprimento do dever sacerdotal, pobre, longe do povo que servira com tanta dedicação.



DALL’ALBA, João Leonir. Histórias do Grande Araranguá. Araranguá; Gráfica Orion, 1997. (Pág. 551,552)

Anexo Foto do Arquivo Histórico de Araranguá